Repetimos aqui uma nota que publicamos em dezembro de 2011 no blogue Vera Philosophia.
* * *
Frithjof Schuon faz uma distinção fundamental entre metafísica, filosofia e teologia.
Ela está no começo de seu primeiro livro em francês, De l’unité transcendante des religions (Éditions du Seuil, Paris, 1979), publicado em 1948. Há uma tradução para o português, recém-lançada: A Unidade Transcendente das Religiões, IRGET, 2011. (Há uma tradução brasileira anterior, de Fernando Guedes Galvão, publicada na década de 1950, mas com muitos erros sérios.)
Vamos ao texto:
- “… na realidade, esta [a metafísica] tem um caráter transcendente que a torna independente de um pensamento puramente humano, seja este qual for. Para bem definir a diferença que há entre os dois modos de pensamento, diremos que a filosofia procede da razão, faculdade totalmente individual, enquanto a metafísica está ligada exclusivamente ao Intelecto; este último, Mestre Eckhart assim definiu, com pleno conhecimento de causa: ‘Há na alma algo que é incriado e incriável; se toda a alma fosse assim, ela seria incriada e incriável, e esse algo é o Intelecto.’ Encontra-se no esoterismo muçulmano uma definição análoga, mas mais concisa ainda e mais rica em valor simbólico: ‘O sufi (ou seja, o homem identificado ao Intelecto) não é criado.’
- “Se o conhecimento puramente intelectual supera por definição o indivíduo, se, portanto, ele é de essência supra-individual, universal ou divina e está ligado à Inteligência pura, isto é, direta e não-discursiva, é evidente que esse conhecimento não somente vai além da raciocinação, mas também além da fé no sentido comum deste termo; dito de outro modo, o conhecimento intelectual supera igualmente o ponto de vista especificamente teológico, o qual, por sua vez, é no entanto incomparavelmente superior ao ponto de vista filosófico ou mais precisamente racionalista, pois, como o conhecimento metafísico, ele emana de Deus e não do homem; mas, enquanto a metafísica procede inteiramente da intuição intelectual, a religião procede da Revelação; esta é a palavra de Deus enquanto Ele se dirige às suas criaturas, enquanto a intuição intelectual é uma participação direta e ativa no conhecimento divino, não uma participação indireta e passiva como é a fé. Em outros termos, dir-se-á que na intuição intelectual não é o indivíduo enquanto tal que conhece, mas enquanto ele, em sua essência profunda, não é distinto de seu Princípio divino; assim, a certeza metafísica é absoluta em razão da identidade entre o conhecedor e o conhecido no Intelecto.”
Esquematicamente:
Metafísica
Conhecimento pela intuição intelectual; participação direta no conhecimento divino; certeza absoluta; não é o indivíduo que conhece, mas sua essência divina. Emana de Deus.
Teologia
Tem origem na Revelação e se baseia na fé; a fé é uma participação indireta e passiva no conhecimento divino. Emana de Deus.
Filosofia
Procede da razão. Conhecimento indireto. Emana do homem.