Emoção e objetividade

 

Por um lado, admiramos corretamente uma coisa porque a compreendemos; por outro lado, compreendemos uma coisa admirável ao admirá-la, isto é, nossa admiração amplia e aprofunda nossa compreensão primeira. A emoção ou o sentimento, neste caso, é um modo de assimilação; é, portanto, um modo subordinado de conhecimento, o qual intervém logicamente a posteriori, mas que, de fato, pode coincidir com a percepção física ou intelectual. Também a nobreza de caráter, ou a virtude, é antes de tudo uma predisposição à adequação quase existencial, paralelamente ao conhecimento propriamente dito; o que significa que ela é uma maneira de ser objetivo, de estar em conformidade com a realidade, o que, conforme o caso, exige certa abnegação; ser perfeitamente objetivo é um pouco morrer, já escrevemos em algum lugar.

Em nossos dias, louva-se a “objetividade” de um homem que afirma calmamente e friamente que dois mais dois são cinco, e acusa-se de subjetividade ou de emotividade o homem que replica com indignação que dois mais dois são quatro; não se quer admitir que a objetividade é a adequação ao objeto, não tal ou qual modo de expressão; que o critério da objetividade é a realidade, não o tom, nem a mímica; nem, sobretudo, uma placidez fictícia, inumana e insolente. Esquece-se, sobretudo, também, que a emoção tem seus direitos no arsenal da dialética humana, e que estes – dado que são direitos – não poderiam ser contrários à objetividade; mesmo o pensamento mais estritamente objetivo – intelectual ou racional – acompanha-se de um fator psíquico, portanto subjetivo, a saber, o sentimento de certeza; sem o que o homem não seria o homem. Ora, o homem é “feito à imagem de Deus”, esta é toda a sua razão de ser; censurar um traço natural e fundamental do homem equivaleria a censurar não somente a intenção criadora, mas a natureza mesma do Criador.

O “objetivismo” antiemocional e ficticiamente impassível trai a sua falsidade pela contradição seguinte: aqueles que se fazem porta-vozes de uma racionalidade imperturbável e impertinente são ao mesmo tempo aqueles que preconizam o amor livre – eles não têm nenhum gosto pelo ascetismo – ou que se inflamam a partir do momento em que se fala de política, e outras inconsequências desse gênero; o que prova que sua “objetividade” não é senão erro e ostentação, que ela é aparentada ao orgulho e à amargura; de onde a propensão a pintar de branco os homens vis – salvo quando, por acaso, são adversários políticos – e a pintar de negro os homens de bem, calmamente e sem paixão, ao menos sem paixão visível; é um exemplo daquela moral de mão única tão característica de todos os gêneros de hipocrisia. Seja como for, é preciso reagir contra a opinião psicanalítica – muito disseminada – de que tanto a indignação quanto o entusiasmo revelam sempre um preconceito ou uma parcialidade; opinião simplista que é vizinha de outro erro não menos tolo, a saber, que numa discórdia ninguém jamais tem razão por completo, e que aquele que se inflama está sempre errado.

(Extraído de “Ambiguidade do Elemento Emocional”, de Frithjof Schuon, capítulo do livro Résumé de Métaphysique Intégrale (Resumo de Metafísica Integral, inédito em português), Courrier du Livre, 2000.

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