"Dedica tua mente a Brahman… a morte não te destruirá."

Srî Ramana Maharshi (1879-1950)

O santo Vasishta disse:

“Uma vez pedi ao santo sábio Bhushunda que nos dissesse como foi capaz de escapar das mãos da Morte, quando todos os outros seres no mundo estão fadados a serem esmagados por suas mandíbulas que tudo devoram.

Bhushunda disse:

‘Senhor, tu que sabes todas as coisas vem então perguntar a mim o que sabes tão bem? Tal ordem do Mestre encoraja seu servo a falar quando este, caso contrário, teria refreado sua língua.

‘A morte não destruirá aquele que não adorna seu corpo com as joias de seus viciosos desejos, como um bandido não mata um viajante que não tem uma preciosa corrente de ouro em volta de seu pescoço.

‘A morte não atacará e matará a pessoa que não está viciada pelo veneno da cólera e da inimizade; cujo coração não alimenta em sua escuridão o dragão da avareza, e cuja mente não está corroída pelo cancro das preocupações.

‘A morte não matará a pessoa cujo corpo não está inflamado pela paixão fogosa do apego, que consome como fogo na mata o grão de bom senso que se guardou.

‘A morte não se aproxima do homem que põe sua confiança no imaculado e purificador Espírito de Deus, e cuja alma descansa no colo da Alma suprema.

‘Portanto, a mente que descansa em seu Criador num estado inalterável de calmo repouso não é tomada pelos males e doenças do mundo.

‘Aquele cuja mente está enlevada em santa meditação nem dá algo para outros, nem nada recebe deles; nem tenta ele, em nenhum momento, rejeitar o que ele tem ou procurar o que não tem.

‘Aquele cuja mente encontrou repouso na santa meditação não tem causa para arrependimento.

‘Eleva tua mente acima da multiplicidade das posses mundanas e estabelece-a na unidade do Espírito.

‘Guia teu coração para a felicidade suprema que é agradável tanto no começo quanto no fim.

‘Dedica tua mente a Brahman, Aquele que está além da tua compreensão — para aquela Luz, começo e fonte de tudo, na Qual reside toda a boa fortuna e o alimento ambrosíaco de nossas almas.

‘Não há nada tão amável e duradouro nas regiões que nos rodeiam, acima e abaixo, quanto a permanente paz de uma mente centrada em Deus.

‘Não é bom perturbar a alma com a preocupação com todos os ramos do conhecimento, nem é de forma nenhuma vantajoso escravizá-la no serviço de outro, quando ainda se é ignorante de si mesmo e de seu próprio verdadeiro bem-estar.

‘De nada vale meramente viver longos anos, quando se é afligido pela doença e pelo pesar da vida.

‘Dado que todas as coisas são inconstantes, não-proveitosas e desagradáveis para os homens, o sábio vê que não há senão Uma Realidade, imperecível e além de todo erro, a qual, embora presente em toda parte, transcende o conhecimento de tudo.

‘Essa Essência é Atman, e a meditação sobre Ela é o único meio de remover todo o pesar e toda a aflição. Só ela destrói a visão errônea do mundo.

‘A contemplação divina surge como a aurora na atmosfera clara da mente impoluta e se espalha sobre toda sua extensão como a luz solar; ela destrói a escuridão do pesar e do sofrimento e o pensamento errôneo da dualidade.

‘A meditação divina sob a forma de So-Hum (1), ou Shivo-Hum (2), desacompanhada de qualquer desejo ou meta egoísta, penetra como os raios da Lua na escuridão da noite da ignorância.

‘Há uma distante semelhança a esta luz espiritual e a luz intelectual dos filósofos.

‘Eu me ponho sentado e quieto a todo tempo, com o pensamento fixo no ritmo de minha respiração, e não me agito e me afasto nem por um momento desde modo, mesmo que o Monte Meru possa tremer por sob mim.

‘A terra tem se erguido e se abaixado renovadas vezes desde do grande Dilúvio, e eu tenho testemunhado a submersão e a emergência dos continentes, sem nenhuma mudança em minha paz, nascida da realização em Deus.

‘Eu observo o curso de minha inspiração e expiração, e contemplo a super-excelência de Brahman, e em função disso fico satisfeito em mim mesmo e gozo de minha longa vida sem nenhum pesar ou doença.

‘Eu nunca elogio ou censuro qualquer ato meu ou de outros, e este desapego de todas as preocupações me trouxe a este estado feliz de despreocupada longevidade.

‘Eu libertei minha mente, ó grande Muni, de suas faltas de volubilidade e de improdutiva curiosidade, e a estabeleci em Brahman acima de todo pesar e ansiedade; ela se tornou deliberada, calma e quieta, e assim adquiri esta longa vida.

‘Nem tenho medo da morte, da doença ou da velhice, nem me animo com a ideia de adquirir um império; este desapego é a causa de minha longevidade física.

‘Não vejo ninguém, ó grande Sábio, à luz de amizade ou inimizade, e essa equanimidade é a causa de minha longa vida.

‘Eu olho toda a existência como o reflexo de Brahman auto-existente, Ele que é tudo em tudo; e conheço o Si como Aquilo, ‘So-Hum‘, e esta é a causa de minha longa vida, ó grande Rishi.

‘Este corpo físico nunca vejo como meu Atman, e esse supremo conhecimento me fez longevo.

‘Estou tão composto em minha mente que nunca lhe permito se enrodilhar nas questões mundanas, nem permito a essas questões tocarem meu coração, e isto me deu a felicidade de minha longevidade que não fenece.

‘Estou feliz com a felicidade dos outros, e tento remover a miséria de todos os seres, e esse universal sentimento de camaradagem pelas feridas e pelos problemas de meus irmãos tem-me mantido vivo e jovial e todos os momentos.

‘Permaneço imóvel como uma rocha, nas adversidades, e sou amigável para com todos, na prosperidade. Nunca me comove a carência ou a riqueza, e essa solidez de mente é a causa de minha infalível longevidade.

‘É minha firme convicção que sou a Inteligência que se manifesta a Si mesma no universo, que habita no céu acima e nos bosques abaixo; e é esta convicção que me faz o Mestre da vida e da morte.

‘É assim, ó santo Sábio, que resido na taça dos três mundos, como uma abelha vive num canto de uma flor de lótus, e sou célebre no mundo como o Sábio perene, de nome Bhushunda.’

Eu lhe respondi:

‘Ó venerável Senhor, tu me fizeste um discurso maravilhoso. Em meus caminhos pelo mundo, pude testemunhar a grandeza e a dignidade de deuses e doutos homens, mas nunca vi um Sábio tão santo como tu. Saudações a ti, ó conhecedor de Brahman !’ “


Notas:

(1) So-Hum: “Eu sou Ele.”

(2) Shivo-Hum: “Eu sou a Felicidade.” “Eu sou Shiva.”

Extraído de World within the Mind (Yoga-Vasishtha), “Extratos dos Discursos do Sábio Vasishtha a seu Discípulo, o Príncipe Rama, e a História da Rainha Chudala, traduzido do Sânscrito de Valmiki por Hari Prasad Shastri”. Shanti Sadan, Londres, 2007, pp. 75-79.

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