A máquina tende a fazer do homem o que ela é

Tear na Grécia antiga: ofício contemplativo. Foto: Metropolitan Museum of Art.

É difícil negar, quando ainda se é sensível às normas verdadeiras, que a máquina tende a fazer do homem o que ela é; que ela o torna brusco, brutal, vulgar, quantitativo e estúpido como ela, e que toda a “cultura” se ressente disso. É o que explica em parte o “sincerismo” e a mística do “engajamento”: é preciso ser “sincero” porque a máquina não tem mistério e é incapaz de prudência bem como de generosidade; é preciso ser “engajado”, porque a máquina só tem valor por suas produções, ou porque ela exige uma supervisão constante e mesmo um verdadeiro “dom de si” [*], e assim devora o homem e o humano; é preciso abster-se, em arte e em literatura, de “complacência”, pois a máquina não é complacente e sua feiura, sua ruidosa agitação e sua implacabilidade se confundem, no espírito de seus escravos e de suas criaturas, com a “realidade”; e sobretudo é preciso não ter Deus, porque a máquina não tem Deus, ou porque ela mesma usurpa esse papel.

[*] Se se nos objeta que o mesmo acontecia nos antigos ofícios, responderemos que há aí uma diferença notável pelo fato de que esses ofícios tinham um caráter propriamente humano e portanto contemplativo, e, por esse fato, não comportavam nem a agitação nem o esmagamento próprios do maquinismo.


Frithjof Schuon, A Transfiguração do Homem, Sapientia, Brasil, 2009, pp. 23-24.