“A opinião popular assimila espontaneamente, e não sem razão, o orgulho à tolice. De fato, pode-se ser pretensioso por tolice, como se pode ser tolo por pretensão; as duas coisas se combinam. Certamente, a falta de inteligência não obriga à pretensão, mas esta não tem como não prejudicar a inteligência; e, se a tolice, como se admite comumente, é a incapacidade de discernir entre o essencial e o secundário ou entre a causa e o efeito, ela comporta por isso mesmo uma parte de orgulho; uma tolice combinada com uma perfeita humildade e um perfeito desapego já não seria tolice, mas sim uma simplicidade de espírito que não incomodaria nenhum homem inteligente e virtuoso.
“Muito próxima da pretensão está a arrogância; mas esta é passiva, e aquela, ativa. É arrogante não aquele que, com direito e muita humildade, está consciente do valor daquilo que sabe ou daquilo que faz, mas aquele que está imbuído de seu próprio valor imaginário e o projeta sobre seu pequeno saber e sua atividade medíocre. A humildade não é de modo algum contrária à autoridade, e não poderia mesmo sê-lo, pois a autoridade é uma qualidade positiva; humildade não é modéstia, o que mostra que a autoridade exclui esta ao mesmo tempo em que inclui aquela. Fazendo-se abstração de todo humilitarismo automático e excêntrico — mas inevitável e eficaz na ordem psicológica que lhe corresponde —, a humildade é a consciência de nossos diversos aspectos de fraqueza real, não imaginária, e ao mesmo tempo a ausência de todo desejo de afirmação individual; a modéstia, por contraste, é a consciência não de nossa limitação ontológica, nem de nossa insuficiência humana, mas simplesmente de nossa incompetência ou de nossa incapacidade em determinado caso; de uma lado, a modéstia se aproxima da humildade, mas de outro ela se afasta, o que explicitaremos dizendo que a modéstia deve sempre ser humilde, mas que a humildade nem sempre tem de ser modesta.”
(Frithjof Schuon, trecho do ensaio “O Duplo Obstáculo”, do livro O Olho do Coração, inédito em português.)